segunda-feira, janeiro 24, 2005

Eu

Uma caveira, o coração secreto,
Os caminhos do sangue ainda meu,
Os túneis que há no sono, esse Proteu,
as vísceras, a nuca e o esqueleto.
Sou essas coisas.
Mas incrivelmente
Sou também a memória de uma espada
E a de um solitário sol-poente
Que se dissipa em ouro, em sombra, em nada.
Sou o que vê as proas neste porto;
Sou os contados livros, as contadas
Gravuras pelo tempo já cansadas;
Sou o que inveja cada homem morto.
Mais estranho é ser este que entrelaça
Palavras no aposento de uma casa

Jorge Luís Borges - A Rosa Profunda (1976)

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