terça-feira, janeiro 25, 2005


No dia dos meus anos recebi este postal de parabéns!
(Jack Vettriano)

segunda-feira, janeiro 24, 2005

Mar do Meco (poema à posteriori…)

Acho-te percorrendo as dunas
em pensamento
Perco-te nas ondas vagas
no esquecimento
Encontro-te a cada passo
e num momento
Perco-te e não te acho
que sofrimento!
Sinto o mar revolto
e não te vejo
Estás perdida na bruma
na manhã fria
Pressinto-te no mar do Meco
e estremeço
Morro ao pensar que te tenho
e te não mereço!

Vidas Paralelas

Sós
percorremos as distâncias
Juntos
preparámos o caminho.

Vidas paralelas
cruzadas no infinito
lá,
onde o amor é (im)possível!

Poema Incompleto

No teu colo
Minha cabeça pernoita
Morna Luz no espaço!

Os beijos
São como flocos
Um no outro...tocando!

Inspirado no José Craveirinha e na A.M.
ao folhear um livro na FNAC

Poema erótico

Nos teus seios
perdi-me na distância
olhos nos olhos...sofrendo!

Nos teus olhos
penetrei-te a alma
dedos nos dedos...gemendo!

No teu colo
encontrei-te um sorriso
corpo no corpo...exangues!

Jantar a sós

Vagueio ... nas luzes intensas
Imerso nos sons nocturnos
de um solo de saxofone.

Busco uma voz, que me chame
e me acalme os medos,
...me sossegue.

Perco-me na espera da hora
em que me fales.
... e me digas...estou aqui!

Canção Excêntrica

Ando à procura de espaço
Para o desenho da vida.
Em números em embaraço
E perco sempre a medida.
Só penso encontrar saída,
Em vez de abrir um compasso,
Projeto-me num abraço
E gero uma despedida.
Se volto sobre o meu passo,
é já distância perdida.
Meu coração, coisa de aço,
Começa a achar um cansaço
Esta a procura de espaço
Para o desenho da vida.
Já por exausta e descrida
Não me animo a um breve traço:
- saudosa do que não faço,
- do que faço, arrependida. . .

Cecília Meireles

Ranger de Portão

Ficou teu cheiro no meu sofá
A estrela que apontaste continua no céu
E o prazer de ter tua pele encostado tanto na minha continua denso.
Ainda sinto teu calor.
Te foste sem ter cometido o pecado
Saíste pela porta como um anjo louco que passou.
Sinto irritação pelas verdades que disseste.
As mentiras se perderam
A tua lembrança me provoca.
Onze horas.
Estás chegando em tua casa.
Tenho o corpo desprotegido e uma brisa fresca
Me rouba a sensação de ter estado contigo
Meu corpo esfria.
Vou dormir.
Só tenho acordado comigo um mosquito que zumbe no meu ouvido e me morde.

Poema para um anjo_distante (2000)

Os meus Livros

Os meus livros ( que não sabem que existo )
São uma parte de mim, como este rosto
De têmporas e olhos já cinzentos
Que em vão vou procurando nos espelhos
E que percorro com a minha mão côncava.
Entendo que as palavras essenciais,
As que me exprimem, estarão nessas folhas
Que não sabem quem sou, não nas que escrevo.
Não sem alguma lógica amargura
Mais vale assim.
As vozes desses mortos
Dir-me-ão para sempre

Jorge Luís Borges - A Rosa Profunda (1976)

Sou

Sou o que sabe não ser menos vão
Que o vão observador que frente ao mudo
Vidro do espelho segue o mais agudo
Reflexo ou o corpo do irmão.
Sou, tácitos amigos, o que sabe
Que a única vingança ou o perdão
É o esquecimento.
Um deus quis dar então
Ao ódio humano essa curiosa chave.
Sou o que, apesar de tão ilustres modos
De errar, não decifrou o labirinto
Singular e plural, árduo e distinto,
Do tempo, que é de um só e é de todos.
Sou o que é ninguém, o que não foi a espada
Na guerra.
Um esquecimento, um eco, um nada

Jorge Luís Borges - A Rosa Profunda (1976)

A Casa

Sentir de novo... aquela dor...
A pouco e pouco respirar... aquele amor que foi
vivido e esquecido... em segredo...
(Como ninguém!...)Perdoar... Como perdoar?!...
Há tanto tempo que eu queria mudar...
queria voltar!...

(Acordar...
Deixar o dia passar devagar...
e assim ficar...)

Sentir de novo... aquele amor...
A pouco e pouco consolar... aquela dor que foi
vivida e sofrida em silêncio...

Chegar de novo... sentir o amor...
(Voltar a casa sem pensar
deixar a luz entrar!...)
Esquecer aquela mágua... sem ter medo!
(Como ninguém!)

Encontrar... poder encontrar...
todas as coisas que eu não soube dar...
Saber amar...

Perdoar... saber perdoar?...
Há tanto tempo que eu queria mudar!...
Queria voltar!

Aceitar...
Deixar que o tempo te(me) faça voltar
Saber esperar!...

“ Alma Matter” de Rodrigo Leão

Eu

Uma caveira, o coração secreto,
Os caminhos do sangue ainda meu,
Os túneis que há no sono, esse Proteu,
as vísceras, a nuca e o esqueleto.
Sou essas coisas.
Mas incrivelmente
Sou também a memória de uma espada
E a de um solitário sol-poente
Que se dissipa em ouro, em sombra, em nada.
Sou o que vê as proas neste porto;
Sou os contados livros, as contadas
Gravuras pelo tempo já cansadas;
Sou o que inveja cada homem morto.
Mais estranho é ser este que entrelaça
Palavras no aposento de uma casa

Jorge Luís Borges - A Rosa Profunda (1976)

Anjos e Demónios

Fui nas rouparias que vestem anjos e demônios
E me vesti de guerra, montei no cavalo preto
Armei uma capa e o punhal
Empunhei e dei um grito
Mais cego que minhas intenções
Mais frio do que cristal
Mais duro que diamante
E me lancei contra ti
Doce quimera,
Te lembras, pobre soldado
Quantas facas amolei
Quantas pragas te roguei
Quantos venenos forjei
Para envenenar a mulher
Que sou dentro de ti?
Saiu fogo dos meus olhos
Os meus seios se romperam
Pensei por um momento
Que ia te destruir
E o prazer que senti foi o que me envenenou
Quando vi que tu me amavas
Por debaixo da armadura
Que tu também empunhavas
Morri, doce soldado
Morri esfaqueada
Pelo olhar que me pousaste.

D. Quixote de La Mancha

Cala a boca, amigo Sancho - respondeu D.Quixote-, que as coisa da Guerra estão mais que quaisquer outras sujeitas a contínua mudança. Foi sem dúvida o sábio Frestão, esse que me roubou os livros e a sala em que estavam, quem converteu os gigantes em moinhos para me privar da glória de os vencer.Foi ele, sem tirar nem pôr, tal o rancor que me tem! Mas deixa que, ao fim ao cabo, pouco hão-de poder as suas malas-artes contra a fineza da minha espada!

Era já tarde mas não dormi sem olhar o céu do Meco

Era já tarde quando criei este Blog.
Há muito que sabia ser essa uma das minhas prioridades, sempre adiadas!

domingo, janeiro 23, 2005

O mito de Sísifo

Os Deuses tinham condenado Sísifo a empurrar sem descanso um rochedo até ao cume de uma montanha, onde a pedra caía de novo, em consequência do seu peso. Tinham pensado, com alguma razão, que não há castigo mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança. Se este mito é trágico, é porque o herói é consciente. Onde estaria, com efeito a sua tortura se a cada passo a esperança de conseguir o ajudasse?

O operário de hoje trabalha todos os dias da sua vida nas mesmas tarefas, e esse destino não é menos absurdo. Mas só é trágico nos raros momentos em que ele se torna consciente.Sísifo, proletário dos Deuses, impotente e revoltado,conhece toda a extensão da sua miserável condição: é nela que ele pensa durante a sua descida.

A clarividência que devia fazer o seu tormento consome ao mesmo tempo a sua vitória. Não há destino que não se transcenda pelo desprezo.

* Albert Camus - O Mito de Sísifo, Ensaio sobre o Absurdo: Lisboa, Livros do Brasil, 1972.